Ao final de década de 1980, Paulo Cezar Alves Goulart, pesquisador da Equipe Técnica de Pesquisas em Artes Gráficas fez detalhado e minucioso levantamento junto aos arquivos de jornais, revistas e almanaques paulistanos editados no século XIX, com o intuito de realizar um panorama das artes gráficas e da fotografia deste período. A descoberta do ensaio foi uma feliz surpresa, considerando a necessidade de abordagens panorâmicas da fotografia em São Paulo, relata Ricardo Mendes, pesquisador em história da fotografia. Assim ao longo de 1993, decidimos nos reunir, para reescrever o ensaio, tentando conciliar o levantamento precioso, associado ao manuseio das fontes, com acesso freqüente aos arquivos de imagens, o que resultou enfim na versão atual. A seleção de imagens, a partir do acervo do Museu Paulista USP, o mais completo conjunto de fotos produzidas em São Paulo no século XIX, disponível em arquivos públicos a cidade, nos permitiu complementar informações encontradas em publicações. Ao leitor esta edição final oferece a possibilidade de abordagens simultâneas ou instrumento de fonte de consulta. O projeto gráfico segue a mesma orientação, ilustrando o texto e mostrando a diversidade da produção do nosso passado. Uma análise mais cuidadosa das práticas fotográficas oitocentistas vem confirmar que se a fotografia representa o acesso à imagem de diversas camadas da população, não deixa de trazer as marcas da diferença social, evidenciadas por uma concepção de qualidade que não era apenas técnica ou artística. Ernest Lacan, editor da primeira revista fotográfica La Lumière, estabelecia relação precisa entre fotógrafos atuantes em Paris, nos anos 50 do século XIX, a localização de seus ateliês no mapa da cidade e os preços cobrados por cada um deles. Existia uma diferença substancial entre o fotógrafo básico (trabalhador ou artesão), o artista-fotógrafo (proveniente da burguesia), o fotógrafo amador (aristocrático) e o fotógrafo-sábio, que reclamava para si o status de artista, segundo Annateresa Fabris, que assina texto de apresentação do livro. Noticiário Geral da Photographia Paulistana: 1830-1900 permite aplicar parcialmente as observações de Lacan ao caso específico de São Paulo. Dos anos 50 aos anos 80, os profissionais buscam como endereço para seus ateliês as ruas Direita, São Bento ou Rosário; em 1890, verifica-se presença de um núcleo significativo no Brás bairro que atrai imigrantes e industriais e tem seu crescimento devido à rede ferroviária Central do Brasil e Santos Jundiaí. Alguns estabelecimentos situam-se em Santa Efigênia, bairro de classe média. Se a localização dos estúdios fotográficos é dado importante na visualização de um mapa da fotografia paulistana do século XIX, outros fatores são elaborados ainda para a construção da história social da imagem, a partir da pesquisa criteriosa dos autores. A importância da fotografia na cidade de São Paulo no século XIX é ressaltada pela variada oferta da daguerreótipos e cartões de visita, acompanhada pela proposta de vistas, álbuns temáticos, retratos de crianças, novos formatos como o selo (Michelle Rizzo), o bouquet (Valério Vieira), o mimoso (Vincenzo Pastore), o cartão postal, recursos como a ampliação (Walter Bradley), retrato ao luar (Victor Telles), fotografias a domicílio (Photografia Scandinava, Photografia Artística), confecção de retratos a partir de fotografias e o arquivamento negativo para cópias posteriores. O livro não se detém apenas nos usos privados da fotografia. Paulo Cezar Alves Goulart e Ricardo Mendes conseguem extrair das fontes consultadas dados sobre a difusão da imagem técnica na sociedade paulistana ao analisarem os usos políticos, científicos e pragmáticos da fotografia. É na década de 1890 que a polícia de São Paulo começa a utilizar o registro fotográfico, usado não só como fonte documental, mas como meio de prevenção direta na exposição de fotos de indivíduos perigosos em estações ferroviárias e redações de jornais. Noticiário Geral de Photographia Paulistana propõe um olhar sobre o desenvolvimento do setor na cidade de São Paulo, registra os profissionais de diversas procedências e atesta a importância da fotografia na sociedade do século XIX. Um ensaio rigoroso, ressaltando a importância da imprensa local como fonte de pesquisa.