A relação entre produção e consumo de alimentos tem sido claramente transformada a partir de eventos globais, envolvendo um mercado fortemente moldado pela força de grandes corporações, comercializando commodities agrícolas, industrializando alimentos e definindo padrões de consumo. Tendo por base a centralidade do agronegócio americano, o sistema agroalimentar evoluiu desde o pós-Segunda Guerra na direção de uma estrutura globalizada, cuja capilaridade se estendeu de forma significativa a partir do final do século XX atingindo comunidades localizadas até nos mais remotos espaços. Dispondo como referência os traços estruturais da ordem alimentar atual, regulada por mercados amplamente financeirizados, sob a prevalência de princípios neoliberais, esse processo desembocou em visíveis contradições. Ao mesmo tempo em que forças hegemônicas instaladas em complexas estruturas agroindustriais, da agricultura às redes de abastecimento, elevaram o potencial produtivo, não têm impedido a ocorrência de crises alimentares sistêmicas e os fenômenos da fome e da subnutrição. O ambiente de insegurança alimentar assim formado tem desafiado organismos internacionais e instituições governamentais, cujas iniciativas ainda recorrem a argumentos malthusianos e de falhas de mercado. Por outro lado, uma agenda contra-hegemônica tem sido formulada no interior da sociedade civil e veiculada por movimentos sociais de alcance global, para os quais a soberania alimentar é o caminho para superação desses desafios