Um trabalho inédito de Amélia Toledo é, via de regra, surpreendente, ainda mais por se tratar de um livro, o seu primeiro. A soma dos anos só fez alargar o campo de atuação dessa artista conhecida por sua obra plural no campo das artes visuais. Amélia transita com igual desenvoltura da pintura de ateliê à produção industrial, da fatura artesanal de jóias à realização de grandes projetos em espaço urbano. E toda essa bagagem não lhe pesa. Ao contrário, a torna livre para ousar no campo da escrita. Por volta de 1995, começou a escrever as aventuras do Juca. Um pedregulho, um seixo, um caco de montanha que, em sua vida rolante, rolara por montes e vales até chegar ao Brasil. "Parece que, no fundo do Juca, algo o fazia saber que o Brasil teria muita importância em sua vida. Sim, porque, afinal, ele era sósia (mais ou menos clone) do Saci-Pererê, só que o Saci pulava numa perna só, e o Juca andava rolando..." Essa linguagem me fez lembrar Macunaíma, a genial criação de Mário de Andrade. O tom oral da narrativa, a cadência produzida pelas reiterações, a mescla do real ao maravilhoso, o uso frequente do diminutivo, tão típico do falar brasileiro, o tom brincalhão de algumas passagens, tudo isso é próprio da rapsódia de tradição popular, do mito. "O mito é uma fala", dizia Barthes. Ao contar as peripécias do herói, Amélia nos ensina a ver o mundo. Entre uma exposição e outra, em meio à complexidade da implantação dos projetos públicos, Amélia arranjou tempo para terminar o livro que vem a ser publicado por iniciativa da F/Nazca em cooperação com a Galeria Nara Roesler. Essa parceria incomum retoma a histórica interface de arte e publicidade. A edição é um presente. É leitura que foge à mesmice. É estória para ser lida pelos pequenos e comentada por gente grande.