O rei se inclina e mata, coletânea de ensaios que a Biblioteca Azul acaba de publicar da escritora Herta Müller, é "totalmente autobiográfica", na definição da própria autora. O livro inicia-se com suas memórias de infância em Nitzkdorf, uma pequena aldeia na região do Banat romeno. Nela, a menina Herta começa a construir a relação muito própria com as palavras que manteria na maturidade, relação cheia de astúcia, já intuindo que, criadas para se falar e pré-validadas pelos "de fora", as palavras mais subjugam do que qualquer outra coisa - mesmo quando proibidas de serem ditas. A pequena aldeia natal de Herta Müller, longe de afirmar-se como integrante da complexa paisagem transnacional da Europa centro-oriental em que se inseria, fechou-se então sobre si mesma, em seu germanismo ou, antes, em seu "suabismo". Parte do sistema de cooperativas agrícolas do regime comunista romeno, seu dia a dia era o trabalho no campo em um ambiente pleno de silêncio autoimposto e solidão, mas também permeado de chauvinismo e xenofobia, como logo se dará conta Herta Müller.