A anoréxica, por uma recusa obstinada da alimentação, por uma luta sem perdão contra a necessidade, afirma, desprezando a morte, a soberania de seu desejo, desafiando todo limite, chegando a negar seu corpo, o Outro e qualquer diferença. Fugindo de todo prazer carnal, ela aspira ao Ser. Tal como uma mística, ela goza, numa transgressão sempre relançada na expectativa de se perder, de se abolir como sujeito. Ela oferece ao olhar o espetáculo insuportável de um corpo descarnado, esquelético, espectral que presentifica a morte.A despeito da riqueza das observações clinicas desde Freud, não se revelou o papel da tentação anoréxica, suplício de Tântalo que ela se inflige e que contamina toda sua atividade de pensamento. Fiel a um passo analógico que se inspira em Freud, Eric Bidaud mostra seu parentesco com os exercícios espirituais da ascese e do jejum, práticas religiosas fundamentadas na exigência da purificação e no apelo ao sagrado.