A poesia não é mais a mesma. Chega às livrarias pela Rocco o primeiro livro de Rogério Skylab, Debaixo das rodas de um automóvel, com sonetos marcados pela mesma irreverência apresentada ao público em seus seis CDs. O poeta Skylab, assim como o compositor, é surpreendente e engraçado, com sua visão de mundo cínica e soturna e seu humor negro escatológico. O autor costuma dizer que compor "é uma distração, um desvio, uma alienação, uma transcendência". Em suas poesias ele transcendeu. Ao lado do deboche e do escárnio, há momentos de doçura como quando ele fala de seu universo vivido, sua relação com as ruas do bairro de Botafogo, com o shopping center onde ele diz flanar observando as vitrines coloridas e as pernas das moças. Essa relação com a casa, com o quarto, o bairro, o lugar é revelada em grande parte dos sonetos. Outros temas percorridos por Skylab são o tédio, os amores, a solidão, o desterro e a desesperança. Em sua poesia, Skylab consegue descrever de maneira crua imagens, cenários, acontecimentos cotidianos que, de tão corriqueiros, foram banalizados. Situações vividas diariamente sem serem notadas: é desse material descartado no dia-a-dia que ele constrói seus versos, e atira de volta ao leitor perplexo os sentimentos, pensamentos e impressões jogados fora. São sonetos imagéticos: o leitor é capaz de ver o poeta deitado esperando a morte; roubando um livro para abastecer suas cinco estantes repletas de obras furtadas; ou o transeunte pensativo no caminho para o trabalho após observar um atropelado morto-vivo. Pouco auto-indulgente, Skylab diz achar-se horrível, inapelavelmente nu e só em "Feriado Nacional". Já em "Curriculum Vitae" avisa não ter diplomas, que sua única experiência é ficar sentado no sofá e "de vez em quando escrever à mão coisas de somenos importância" para, debochado, perguntar no final se quem sabe um dia não será aproveitado. Duro e lírico, ao falar de cartas de amor que teria escrito, Skylab diz ter descoberto os memorandos: "rápidos e sem nenhuma sutileza como uma porrada no estômago". Os versos de Skylab também são como um soco no estômago, mas que deixa marcas sutis em quem lê.