A perda de um filho causa uma ruptura no modelo da vida, e anula a concepção de família feliz. Não se vive mais impunemente. Perde-se a rotina de hábitos normais que incluem as pequenas e contínuas celebrações. Sabemos da realidade da morte, porém dependendo do grau de distanciamento que tenhamos com a experiência de luto, nos ocorre pensar que seremos imunes às tragédias, e que, as pessoas que amamos, viverão, e morrerão no tempo devido: sempre depois de nós. Quando essa ordem se subverte, e a morte leva um filho, antes dos avós, e dos pais, é preciso desmontar o roteiro previsível que criamos. Sobreviver à morte de um filho é uma violência física, psicológica, e moral, uma espécie de doença que se instala na alma, e repercute em todas as dimensões. Escrevi estas memórias para compartilhar não apenas a perda, mas a forma como Deus se introduziu no tecido cicatricial da minha alma. A forma como Ele me feriu, e diminuiu o âmbito da minha ferida.