Um dos expoentes da espiritualidade na história ocidental, João da Cruz encarna, de forma modelar, a figura de quem, após padecer ou gozar uma específica e intensa experiência, busca comunicá-la a um círculo de companheiros afins quanto a tais inquietações espirituais; por extensão, numa projeção universal, a todos que anseiam se realizar plena e autenticamente. À experiência dramática de injustiça, solidão ou da própria fragilidade da existência deu João da Cruz o nome simbólico e evocador de noite escura. Expressão que acabou por identificar-se com este autor e com tais experiências. O livro da Noite Escura, mesmo com sua precária estrutura enunciativa perante a experiência vivida, disserta sobre o programa da ação divina e místico-contemplativa, numa reflexão sobre o afetivo e o intelectivo na dinâmica da vida espiritual, a qual, presume-se, poderia ter interesse para uma análise atual de certos fenômenos ditos de cunho místico e das teorias acerca da "inteligência emocional". A vida espiritual, enfim, é um itinerário de libertação até a comunhão divina que acontece obscura e passivamente na alma graças à influência divina.