Há muito tempo a literatura brasileira conta com um grupo notável de escritoras. Rachel de Queiroz, Clarice Lispector, Cecília Meireles, tantas outras, criaram uma obra de altíssima qualidade artística, figurando entre os maiores escritores do país, sem discriminação de sexo. Já era hora, pois, de parar de se falar em literatura feminina. Em matéria de literatura, como em qualquer outra arte, o que regula é a qualidade da obra e não o sexo do artista. O autor faz literatura, como Augusta Faro no volume de contos A Friagem, ou não faz. Com uma visão bem feminina do mundo e da vida, Augusta Faro explora com agudeza o universo íntimo da mulher, suas angústias e perplexidades, esperanças e sonhos. Realismo a que se mistura, por vezes, o fantástico (As Sereias) ou o absurdo (Check-Up). Mas a autora sabe também captar a vida misteriosa de outros seres da natureza, animais como a gaivota que se violenta para dominar seu impulso de voar, e objetos inanimados, como o boneco desarticulado por um louco. Obra repleta de humanidade, A Friagem é também um livro inconfundivelmente de Goiás, como observou Roberto Pompeu de Toledo: "É a cidade de Goiás velho que se adivinha, embora nunca citada, como cenário das histórias - um lugar de personagens primordiais, como o padre e a parteira, lavores domésticos, ruas estreitas, sobrados seculares, tempo lento, crenças que datam do começo do mundo e solidões invencíveis". Augusta Faro pertence a uma família de intelectuais, da qual o nome mais expressivo é o de seu primo, Bernardo Élis. Sua avó, da qual herdou o nome, foi a primeira mulher goiana a publicar livro, os Devaneios, editado em São Paulo, em 1891. Escrevendo desde a adolescência, Augusta Faro estreou em 1982, tendo publicado vários livros de poesia e literatura infantil. A Friagem, que se encontra na quarta edição, é a sua estréia na ficção.