"Este livro nos conta a tempestade a partir dos muitos ventos e ventanias que a formam. E nesse vôo viajam uma mulher e muita gente, através de muitos lugares, em um tempo que quis ser muitos tempos." - Eduardo Galeano UMA TEMPESTADE COMO SUA MEMÓRIA: A HISTÓRIA DE LIA, de Martha Vianna, conta a história de Maria do Carmo Brito, codinome Lia, única mulher a assumir um posto de comando no movimento guerrilheiro de resistência ao regime militar no Brasil. Maria do Carmo era o braço direito de Carlos Lamarca na VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), assumindo a direção da organização após sua morte. Uma revolucionária nascida e criada nos mais rígidos moldes da conservadora sociedade dos barões mineiros do leite. Ao mesmo tempo, uma mulher capaz de manter um olhar humano sobre a vida, mesmo numa circunstância claramente política. "Como é que numa guerra, além de estar fazendo a guerra, ainda é possível ser mulher? Foi isso o que me atraiu, o que me levou a escrever sobre Maria do Carmo", argumenta Martha. Martha Vianna conheceu Maria do Carmo, aos 18 anos, no Colégio Estadual de Belo Horizonte, quando ambas cursavam o Clássico. Essa singular simbiose entre autora e personagem gerou uma narrativa na qual o leitor vai encontrar a brutalidade dos quartéis brasileiros, através de descrições detalhadas das sessões de tortura pelas quais Maria do Carmo passou, assim como uma relação das principais técnicas de interrogatório e objetos utilizados pelos militares para arrancar informações dos guerrilheiros. Mas há, também, histórias leves e curiosas, como a distribuição de calcinhas de renda, num país muçulmano, para as guerrilheiras brasileiras trocadas por um embaixador seqüestrado. Martha resolveu repartir o que conhecia de Maria do Carmo com o público: "Maria do Carmo tem uma visão humana da resistência política, a visão de uma mulher. Quis escrever um livro com olhar feminino, meio como se a gente pudesse encontrar a Joana D""Arc, conversar com ela e ver que ela lavava roupa ali, que era uma mulher com todas as coisas que isso significa". Em difíceis sessões de entrevistas - Maria do Carmo, muitas vezes, não queria relembrar o passado -, Martha foi refazendo os passos da amiga. Martha também consultou a Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo e inúmeros documentos do DOPS carioca, quando os arquivos foram abertos. UMA TEMPESTADE COMO SUA MEMÓRIA: A HISTÓRIA DE LIA acompanha a trajetória de Maria do Carmo desde a infância e adolescência até o seu retorno ao país após o exílio. Sob o nome de Lia, Maria do Carmo começou a atuar em movimentos de resistência ainda nos anos 60, numa clandestinidade que coexistia com a vida "normal". A princípio, sua luta era às claras, mas as circunstâncias políticas levaram Maria para a clandestinidade total. Um caminho que a separou de Martha Vianna. A escritora, apesar de ter militado durante os anos da ditadura, não seguiu o caminho da luta armada, embora não tenha perdido o contato com a amiga. "Antes de 64 eu militava na AP, a Ação Popular, no CPC de Minas, e também tinha essa coisa de militância estudantil, porém mais social", finaliza a autora. Maria do Carmo Brito, codinome Lia, ainda é viva, tem uma filha e mora na Zona Sul do Rio de Janeiro. Após o exílio, retornou ao Brasil e ingressou no serviço público, onde coordena projetos nas áreas social e de educação. Martha Vianna nasceu em Belo Horizonte, em 1941. Em sua juventude estudou Direito na UFMG e foi militante da Ação Popular, além de dedicar-se ao teatro e a cerâmica. Entre 1957 e 1958, e, mais tarde, entre 1965 e 1967, viveu em Paris. Depois, entre 1973 e 1983, morou em Buenos Aires, Madri e México. Neste país, trabalhou no Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). Voltando ao Brasil, trabalhou no Governo do Estado do Rio e na prefeitura da cidade do Rio, e foi editora da Francisco Alves. Desde 1997 dirige o escritório da União Latina no Brasil. Este é seu primeiro livro.