A democracia triunfou grandemente e vacilou persistentemente. Na atualidade, ela é vista mais como um problema com o qual nos debatemos, do que como uma solução evidente da qual partimos. É uma trivialidade dizer que ela está em crise e é alvo de crítica; para tanto, basta percorrer o olhar pelos catálogos de livros publicados nos últimos dez anos nas ciências humanas e sociais. Buscando ampliar o horizonte espacial e temporal de nossa reflexão para além do estreitamento na perplexidade do tempo presente, não nos contentamos em dizer que vivenciamos uma crise de representação da vontade popular e visamos aqui nos perguntar sobre o que é, afinal, a democracia. Recusando-nos a tomar como estabelecidas certas evidências sobre a democracia, partimos de uma série de questões bem características da forma de pensar do historiador do político e teórico da democracia Pierre Rosanvallon: se a democracia é um regime de soberania popular, o que é o povo e como ele exerce sua soberania e manifesta sua vontade? Quais são as relações entre a soberania do povo e a representação política, entre a autonomia coletiva e a autonomia individual, entre a democracia e o liberalismo? Movido por tais reflexões, este livro busca introduzir ao público brasileiro o pensamento de Rosanvallon e tenta refletir, em diálogo com ele, sobre a crise e as mutações das democracias contemporâneas. No conjunto do livro, cremos que se torna evidente o sentido dos parênteses do título: “Uma democracia (In)Acabada”. De fato, a democracia é essencialmente inacabada, como nos ensina o autor, ela é um misto permanente de promessa e de decepção.