Carla Andrade pisa firme no chão da poesia, levitando. Quanto mais leio, mais gosto de seu rebuliço linguageiro. Mais me surpreende a fala crisálida, a habilidade com que desmonta e recria o seu sentido. Os primeiros passos desta poeta mineira mostram que ela não joga com palavras à deriva. Antes, sai pulando marés e amarelinhas, voando pelos vendavais e abismos de um universo muito próprio, dona de asas e enlevos. No desregramento com que ela tece os versos, há um lirismo enigmático provocando as pertinências. Vai deslocando as palavras, bricolando os sentidos (de quem a lê), divertida no jogo da poética, sábia e indiferente no que traduz da vida. Cronista urbana de percepção rural, dialoga com a magia dos reinos de paiol e pedra, da névoa e dos fogos de artifício, do tempo no relógio quebrado, dos fósseis, das feridas. Suas angústias de poeta se diluem numa vasta imagética, de onde, entre o caos e o contraditório, ela extrai suas verdades. Carla tem na voz um eco de infância outro de adolescência, e os dois tempos tramados dão à sua linguagem maturescente um hipnótico encanto. Eu já sabia da inquietude, dos ruídos interiores, das perplexidades, dos delírios plantados em sua extrema sensibilidade. A colheita, claro, não seria em vão. Quando se lê os versos dela, o dia segue mais fluido, a luz, mais juvenil. Lê-la de noite, então, é certo sentir a vida mais leve, as possibilidades do novo nas mãos. Não há muito mais o que dizer. Ela é quem tem tanto, e de modo tão peculiar, a falar. Passo então ao leitor, que poderá atestar como é difícil resistir ser fisgado pelo seu sopro de respiro livre, pela estética de sua expressão. Angélica Torres Lima