Um dos traços característicos das personagens de William Shakespeare é também definidor de todo o nosso continente: descobrimos os nossos desejos, e entendemos a nós mesmos, por intermédio do olhar de um terceiro. Na verdade, como demonstra René Girard, fundador da teoria mimética, essa é a própria condição humana e, como propõe João Cezar de Castro Rocha, é a condição das próprias sociedades. Aqui, a América Latina acrescenta um dado à teoria girardiana: em relações de hegemonia política, o lado não hegemônico sequer pode ignorar a realidade da imitação. Mas, então, se impõe o desafio da mímesis: como reconhecer a centralidade do Outro sem condenar as culturas periféricas à improdutividade? Castro Rocha observa, com o suporte de um grande número de teóricos e artistas latino-americanos, que a propensão do desejo à rivalidade (descoberta por Girard) se traduz, em termos estéticos, numa poética da emulação, a qual fomenta a inventividade. Em vez de temer a influência como de costume, este livro pensa com profundidade sobre o papel que ela desempenha na atividade artística.