1. Foi com um misto de satisfação e responsabilidade que recebi o convite para prefaciar o livro "Efetividade do Processo e Cognição Adequada",de autoria do Professor Universitário e Juiz de Direito Ricardo Tinôco de Góes. A um lado, significa compartilhar da realização pessoal de um amigo, cujas qualidades pessoais e profissionais são reconhecidas em todas as dimensões de sua atuação; sob o outro aspecto, sinto-me não menos gratificado: o prestígio de prefaciar esta obra, para além de situar-me ao alcance da capacidade intelectual do seu autor, torna-me avalista de um criterioso estudo de direito processual, engrandecendo o magistério deste Professor de Direito Constitucional, cujas vertentes e diretrizes conceptuais, conduzem à perfeita sintonia do processo com a Constituição e à realização da justiça constitucional, como direito e garantia fundamental do cidadão, linha de pesquisa a qual me rende, decerto, afinidade com as questões propostas neste estudo. Com efeito, o direito constitucional processual, entre outros sentidos e objetivos, intenta promover a acomodação dos institutos do processo aos princípios constitucionais do processo, ou, por outros termos, dedicar um ambiente constitucional ao processo. 2. É fato notório que os fenômenos sociais ocorridos na realidade de vida da sociedade não podem descurar e deixar de influenciar a produção dos fins de justiça, disso não se afastando o processo, enquanto caminho de pacificação, transformação e concretização do Direito, por meio de decisões políticas configuradoras e reveladoras, no Brasil, de um Estado Social e Democrático de Direito. Efetivar o processo é realizar, no plano prático, uma garantia fundamental de dupla dimensão, porquanto, a um só tempo, está-se a resguardar um direito político e social. É, antes de tudo, dar meios e garantir o sucesso, se houver vitória, de quem tem uma pretensão em vista. Nada obstante, não se traduz em assunto novo, a preocupação da sociedade e do próprio aparato estatal, com as dificuldades expostas pela ausência de efetividade do processo. Obter êxito em questões judiciais, não significa, necessariamente, ter a satisfação do direito; ter a garantia do bem da vida vindicado por meio do processo. Fatores inúmeros, de desnecessária repetição, por vezes, explicam, mas, aos olhos dos usuários dos serviços da Justiça, não conseguem justificar o porquê, após tantos anos de contenda, factualmente, não se realizou a pretensão que estimulou a demanda, a despeito de o processo ter dito o direito, mediante uma declaração, constituição, condenação ou um mandamento. De fato, há um déficit histórico de utilidade, instrumentalidade e de resultado no processo, situação acentuada, quanto maior o hiato entre as fases de conhecimento e execução. Realmente, este problema tem angustiado a todos, nada obstante se tenha por reconhecida a preocupação do poder constituído legiferante em garantir, como direito subjetivo público, um processo com razoável duração, além da elaboração de várias leis, tendo por escopo desburocratizar e instrumentalizar o processo de execução, portanto, tornando-o mais efetivo. Centrada nestas preocupações, a doutrina do Professor Ricardo Tinôco de Góes é de análise recomendada, atendendo, plenamente, às expectativas e propósitos formadores e informativos de sua obra, na medida em que os problemas levantados, no âmago de inferências argüidas em linguagem escorreita e objetiva, têm as suas respostas construídas e desenvolvidas sob critérios científicos e virtuosos, com a fixação de pontos de vista e conceitos inovadores ou com a revisão de conceitos tradicionais, sob novos paradigmas. Com efeito, ostentando proposta de reflexão e busca de alternativas à minimização da chamada crise de efetividade do processo, o trabalho vislumbra a obtenção de tais mudanças, dissertando sobre as fases do processo, propondo a relativização do binômio cognição-execução, para ampliar a fase de cognição, de modo que esta venha a albergar o núcleo da pretensão mediata deduzida em Juízo, refutando-se a "idéia falsa de que nenhum ato de preparação para a satisfação do julgado pode ser realizado antes que se obtenha a certeza quanto à existência do direito material controvertido". Na realidade, o que se pretende é que a idéia de certeza da decisão perca espaço para a idéia de verdade, assim como, a idéia de separação das fases ceda vez à unidade procedimental, tendo o Juiz o poder-dever de conhecer a "realidade material que circunda a vida do devedor". Como isto se dará? Com aportes inequívocos e proficiência, defende o autor a adoção de uma técnica cognitiva ampliativa do campo de incidência e do grau de conhecimento desenvolvido pelo Juiz, na direção do processo, permitindo "o conhecimento não só dos fatos necessários à declaração e ao reconhecimento do direito, mas também para que se conheçam os meios práticos postos à sua satisfatividade." Nesse sentido, com rigor científico, menciona várias situações possíveis de ampliação da técnica cognitiva, nas quais, teoricamente, o Juiz já disporia de meios para tornar efetivo o direito em discussão, fazendo aproximar e complementar as atividades de conhecimento e execução, a exemplo da prevenção à fraude à execução, do manejo da antecipação da tutela, da tutela específica, da execução indireta, da tutela diferenciada e da ação monitória, sob o sentido maior de unidade do procedimento. Em casos como tais, alargam-se os poderes instrutórios do Juiz e a cooperação dos demais sujeitos do processo, todos, concorrendo, inexoravelmente, para um processo de resultados, no qual a pretensão mediata somente se conforma com as condições materiais necessárias mínimas à sua realizabilidade. O direito a uma técnica cognitiva adequada, aquela com os predicados acima dispostos, é direito fundamental de cidadania e reflexo jurídico de uma ordem jurídica justa, digna de um Regime Constituiconal- Democrático. 3. Desse modo, esta preocupação nuclear com a efetividade do processo e a entrega de soluções mais rápidas, porque subtraídas ou construídas de par com a ordem jurídica existente, torna a leitura instigante, recorrente e inovadora. Soluções deferidas do próprio sistema representam contribuições inestimáveis, quando se sabe que a produção de cada lei modificadora do processo demanda uma demorada e angustiante etapa de negociações. É também, por isso, que parabenizo o Professor e Magistrado Ricardo Tinôco de Goés, por esta valorosa obra "Efetividade do Processo e Cognição Adequada", dando por certo, que o desenvolvimento da temática, sob a ótica aqui tratada, estimulará novos estudos e aperfeiçoará outros procedimentos à atividade judicante. Os desafios e vicissitudes da sociedade contemporânea estão a exigir criatividade, respostas concretas, adequadas, imediatas e que, de fato, levem a um resultado de justiça, descortinando novos horizontes. Eis um trabalho de leitura obrigatória aos estudiosos do direito processual contemporâneo!