Na história do moderno teatro brasileiro há um momento que parece, aos olhos retrospectivos de hoje, quase lendário. Uma espécie de idade de ouro de sua eclosão, quando os deuses da arte dramática como que davam largas ao seu vigor e talento na ribalta nacional, sobretudo na Paulicéia do após-guerra. A esta idade de ouro e a esta lenda pertence Nydia Licia. Em Ninguém se Livra de seus Fantasmas, a Editora Perspectiva lança as memórias dessa atriz que por si sós teriam um valor documental inestimável. Mas o poder dos exorcismos praticados nesta invocação autobiográfica vai além. Não apenas porque ela traça um vivo painel do que era e continua sendo a luta para promover, em nossos palcos, um teatro de arte, como relata a crônica dramática da experiência de uma família de judeus italianos, altamente integrados na cultura e sociedade contextuais, que se vê compelida a refugiar-se e consegue abrigar-se no Brasil. Trata-se da autobiografia, sem dúvida, a de uma escritora: Nydia Licia.