"Camila" narra a odisséia de uma personagem feminina, plena de emoções e sentimentos, de alegrias infindas e de tristezas indizíveis, do fundo do poço à altura dos condores. Como toda vida humana, em sua estória se sucedem, alternadamente, a comédia e a tragédia. Como assinalou o filósofo Chesterton, "o homem é um pêndulo, que oscila entre o sorriso e a lágrima." Também, em sua vibrante trajetória, Camila vagueou entre o sorriso e a lágrima. Amou, desamou, reamou, amou de novo, odiou, caiu em êxtases mágicos, orbitais, gozou, orgasmou como uma cadela no cio. Mas experimentou momentos sublimes, de elevação espiritual intensa. Mas a obra, na intenção do autor, pretende transcender os eflúvios de uma existência, por mais extraordinária que ela tenha sido. A sua sobrevivência física e material, testada nos porões da ditadura militar; a denúncia desse holocausto que ela, a ditadura, provocou; a denúncia do machismo - essa praga nacional, que manteve por 500 anos, submissa e escravizada, a mulher brasileira. Aliás, este, um livro de denúncias... Dos bestiais torturadores militares e civis que seviciaram e assassinaram, covardemente, tantos jovens e brasileiros patriotas. Todo machão, potencialmente, é um torturador. Enfim, a ditadura militar - um regime de força totalitário, implantado no Brasil a partir de 1º de abril de 1964. Ela, felizmente, acabou, porque na vida não há mal que se eternize, nem bem que se prolongue. Mas aqui, ao contrário de outros países sul-americanos, ainda não ocorrenciou o ajuste necessário entre o arbítrio e a justiça. Os crimes perpetrados não foram julgados e punidos. Muitas feridas permanecem abertas no seio das famílias enlutadas por este terror da tortura e de assassinatos. E como disse Shakespeare, "ri-se da cicatriz quem nunca foi ferido." A História do País não pode transfigurar-se num rol de impunidades. Há mortos a identificar e cadáveres para enterrar - que perenizam-se ad aeternum nas valas comuns dos cemitérios clandestinos, no âmago de nossos campos e matas, nos terrenos baldios e periferias de nossas cidades... Enfim, nossa História continua em aberto. Urge que as autoridades militares abram, de fato, os arquivos secretos da ditadura para desvendar os crimes que lá ficaram impunes e escondidos, tanto tempo, do povo brasileiro. Urge que agora, transparentemente, se apurem esses delitos perpetrados por maus militares que usaram e abusaram da força e violência para cometê-los. A Nação, o povo brasileiro e as famílias das vítimas esperam isso das Forças Armadas.