Em um país como o Brasil, em que a correspondência entre a difusão formal ou institucional, e a difusão material e individualizada das conquistas da modernidade tem contornos singulares e, muitas vezes, contraditórios, família e religião são temas cujos desdobramentos influem ativamente nos modos como os valores de igualdade e liberdade são partilhados e disputados socialmente. Ambos os temas, mesmo consolidados na literatura das ciências sociais, parecem remotos quando analisados em sua interface. Embora não faltem referências etnográficas esparsas sobre esta em estudos feitos em qualquer cidade, região ou país, a investigação antropológica do que há de verdadeira imbricação entre eles é algo que só muito recentemente tem sido promovido, razão pela qual os textos aqui reunidos, elaborados em contextos de pesquisa muito díspares, representam um relevante esforço acadêmico para a compreensão de nossa época histórica. Todo sujeito social se relaciona de modo afirmativo ou negativo com ao menos uma família nova ou de origem, bem como lida de alguma forma com a religiosidade, institucionalizada ou não. A inquietação ou o alívio, a descrença, a convicção ou mesmo a indiferença em face das manifestações do religioso são condutas que normalmente se dão ao longo da construção da individualidade no seio de um grupo familiar, e reverberam representações e experiências subjetivas mais ou menos sensíveis à pregação modernizante de uma realidade humana desencantada e onipotente. O pronunciado individualismo hoje em vigor no Ocidente dá a entender, erroneamente, que a suposta autonomia da razão sempre permitirá refúgios personalizados e pessoalizados para as dores do mundo. Neste livro, contudo, aprende-se que família e religião fazem valer, tal qual autor e leitor, a primazia da relação e da alteridade, em detrimento de soluções calcadas sobretudo no reconhecimento de nossos próprios umbigos. Sua leitura e sua crítica, portanto, têm bastante a contribuir para a definição de novas questões e estratégicas voltadas para a percepção das atuais formas de vida familiar e religiosa. Sumário - À guisa de introdução; o que perguntamos à família e à religião?, Família, reprodução e ethos religioso - subjetivismo e naturalismo como valores estruturantes; Ethos privado e modernidade - o desafio das religiões entre indivíduo, família; e congregação; Religião, família e individualismo; Religiosidade no contexto das novas tecnologias reprodutivas; Família e laços familiares em um contexto espiritualista; A prática do amor e o amor prático. Identidade e sentimentos em uma família religiosa de classe média; Família e trajetórias individuais em um contexto religioso plural; Os demônios geracionais. A herança dos antepassados na determinação das escolhas e das trajetórias pessoais; Laços sem 'nós' - vida familiar, conflitos comunitários e percursos religiosos; Comunidades de Vida no Espírito Santo - um novo modelo de família?.