Mais conhecida no Brasil por sua farta e premiada produção em prosa, a canadense Margaret Atwood também maneja com maestria os versos. Em A porta, primeira coletânea de poemas da autora, ganhadora do Man Booker Prize por O assassino cego, a ganhar edição no Brasil, ela fala sobre passagem do tempo, política, misticismo, lembranças e sobre o ofício de escrever. A poesia é o lugar onde a autora reflete sobre sua vida com densidade, mas sem perder a ironia e a verve crítica, de quem atravessou o século XX e XXI, sintonizada com as transformações históricas contemporâneas. Com tradução de Adriana Lisboa, A portamostra as múltiplas facetas dessa autora prolixa, de quem a Rocco já publicou quase 20 livros. A casa de bonecas ressuscitada, que evoca lembranças da família; a sensação de luto diante da morte dos gatos tão queridos; a imagem da mãe definhando revelada na metáfora de um afogamento. São várias as lembranças resgatadas do esquecimento nos versos de Atwood. A autora também reflete sobre o papel da poesia e de seu criador. Ela vasculha os porquês da produção literária e lembra, para quem se aventura a escrever, que a poesia só tem sentido na simplicidade. Com sarcasmo, ela lança ao leitor os questionamentos, mas não acredita em respostas. Em outra sequência de poemas, Atwood sustenta seu ativismo ecológico. Não é o tempo o vilão e destruidor do mundo, mas o homem descuidado que se esquece dos detalhes. Já a guerra é descrita com uma fotografia. E a imagem congelada de Joana D`Arc num cartão-postal instiga o leitor a procurar outras referências e olhares. Em alguns poemas, Atwood faz referências diretas a acontecimentos marcantes.Canção do Barco, por exemplo, remete aos últimos momentos do Titanic e a famosa cena da orquestra de violinos tocando, enquanto o navio afunda. E a instalação do artista plástico indonésio Dadang Christanto, de 1996, inspira "Eles Fornecem Provas", uma reflexão sobre o sentido da arte e suas mensagens. O leitor de A porta vai se emocionar com as fortes imagens criadas por Atwood. Portas se abrem e se fecham, conduzindo à plenitude, e também à inquietação, ao desconforto e à melancolia. A porta é um convite para uma jornada poética, da qual o leitor é tratado como cúmplice.