Por que gostamos de histórias fantásticas, trágicas, assustadoras? Por que a natureza inóspita nos atrai? Por que destruição e ruína exercem fascínio? Por que o bem não é necessariamente belo e o mal, necessariamente feio? E como as estéticas filosóficas interpretam esses fenômenos dentro e fora das artes? Essas são as perguntas a que Non satis est tenta responder, mediante uma investigação na história das ideias. Tal investigação abrange um período particularmente fecundo à reflexão de dissenções entre o chamado gosto e os juízos morais ou congnitivos: o período entre Descartes e Kant ou o período do Esclarecimento, posterior à Revolução Científica e à Filosofia do Sujeito, mas anterior à consolidação da Estética como ramo especializado da filosofia, e da Arte como esfera autônoma da cultura. Nesse momento, as certezas metafísicas que outrora garantiam os estatutos do belo e das artes estão definitivamente abaladas pela inflexão para o pensamento moderno, sem que já existam axiomas para uma abordagem de tais temas a partir das novas premissas. Por isso, as perguntas sobre a relação entre qualidades estéticas e parâmetros cognitivos e morais tornam-se mais prementes do que em qualquer outra situação. As teorias têm por ponto de partida as pretensões de universalidade, necessidade e clareza das epistemologias racionalistas e, ao mesmo tempo, são marcadas pela experiência de que fenômenos naturais e obras de arte apenas claros e regrados são, na verdade, insuportavelmente entediantes. O título, Non satis est, é extraído de um verso da Arte poética de Horácio, que foi apropriado pelas teorias estéticas do Esclarecimento inúmeras vezes, para legitimar a ultrapassagem do belo regrado, harmônico, proporcional: "Non satis est pulchra esse poemata: dulcia sunto et quomumque volent animum auditoris agunto" ("Não basta serem belos os poemas: devem emocionar e conduzir a alma do ouvinte aonde quiserem"). A constatação de que as regras de que as regras do belo não garantem que um objeto agrade positivamente leva as teorias estéticas a ênfase em categorias novas ou renovadas, como: sublime, entusiasmo, terror, grandeza, infinitude, estranheza, imaginação, emoção, obscuridade, desprazer, deleite, pesar, sensações mistas. Todas elas se destinam a nomear qualidades que, do ponto de vista do belo regrado, representam "excessos". Exceder significa ultrapassar um limite natural, legal ou convencional, seja no sentido da superação, seja nodo desvio ou do desregramento. Um excesso é algo que vai além do satisfatório, podendo, por isso, incrementar a satisfação tanto quanto revertê-la. A excedência opõe-se à moderação, à frugalidade, à parcimônia, ao comedimento; dela pode resultar exaltação ou fadiga. Excessos são qualidades não necessárias e muito menos universais. Eles são, como o próprio nome diz, aspectos contrários a "uma harmonia regradade todas as partes de um conjunto, de modo que nada se possa acrescentar, retirar ou alterar sem torná-lo pior" (Alberti). Concretamente, tais excessos podem estar nas porções caóticas da natureza, nos jardins selvagens, nas ruínas, nos monstros, nas representações da arte e da literatura antigas tidas por supersticiosas, nas maravilhas da poesia de Milton ou Shakespeare, na visão quixotesca do mundo, nas tragédias, nos terremotos, nas guerras e nas execuções públicas. Tudo isso é apreciado pelo público da época do Esclarecimento; e, quase sempre, mais apreciado do que o próprio belo.