Em 1927, quando pela primeira vez foi publicado o "Decálogo do perfeito contista", na revista Babel, de Buenos Aires, o uruguaio Horacio Quiroga (1878-1937) já havia talhado, a golpes certeiros e minuciosos, alguns de seus lapidares contos: "O travesseiro de plumas", de 1907, e "A galinha degolada", de 1925, entre eles. Era, portanto, quase entrado nos cinquenta anos e respeitado pelos seus pares rio-platenses e outros contemporâneos, como Borges, Juan José Morosoli, Leopoldo Lugones e Juan Carlos Onetti. Como não poderia deixar de ser, o Decálogo é, por um lado, a profissão de fé de um exímio contista, a partilha - generosa, diga-se - de um conhecimento forjado a duras penas, com o objetivo, talvez, de maneirar os excessos literários da juventude, mas, por outro lado, é também um documento literário de uma época e de um modo de se pensar a literatura. No quinto mandamento, lê-se: "Não começa a escrever sem saber, desde a primeira palavra, aonde vais"; no sétimo mandamento, "Não adjetiva sem necessidade, pois serão inúteis as rendas coloridas que venhas a pendurar num substantivo débil". Visando abarcar ambos aspectos dos mandamentos do perfeito contista idealizados por Quiroga - o aspecto aplicável à literatura do próprio autor, bem como o aspecto historiográfico -, Sergio Faraco e Vera Moreira reuniram alguns escritores e intelectuais brasileiros para debater cada um dos preceitos. O resultado, mais do que um livro de crítica, é uma obra que apresenta o grande gênio narrativo de Horacio Quiroga em uma versão debatida e enriquecida para o século XXI.