Julgar é o mais humano e reiterado dos atos. Todos nós valoramos e julgamos atos, pessoas e seus sentimentos. É assim que nos tornamos seres humanos ativos e criativos, tecendo uma infindável rede de experiências físicas, valorativas e morais. Talvez seja essa mensagem de fundo que podemos extrair deste livro delicioso e ao mesmo tempo assustador. Os mecanismos de dominação descritos pela juíza, doutora e humanista, Márcia Novaes Guedes, mais do que desvelar o sofrimento dos seres humanos no ambiente de trabalho, expõem ao sol a mais humana forma de coisificação: impedir os seres humanos de avaliar, valorar e se comportar de acordo com a sua consciência. Como explicar a submissão dos seres humanos aos desígnios do perverso? Como é possível que um ou não mais do que meia dúzia submeta continuamente legiões de subordinados à virtual esterilização das suas consciências, das suas capacidades de discernimento? Por que o poder flerta cotidianamente com a imposição do sofrimento? A força deste livro não está apenas na sua apurada pesquisa bibliográfica, mas se espraia pelo desfile factual e de argumentos sólidos que nos permite verificar a potência institucionalizadora sobre corações e mentes, das estratégias de submissão dos seres humanos no ambiente de trabalho. Sim, o terror psicológico não é um fenômeno contido, não se limita a indivíduos. Contemporaneamente, o perverso e a perversão assumem feição institucional. Embora nós, juristas, necessitemos estabelecer uma relação de causalidade entre sujeitos, eventos e danos para fazer atuar o sistema de proteção e promoção dos seres humanos e da própria civilização, o terror psicológico transformou-se numa estratégia corrente de dominação, uma verdadeira epidemia social. Ler o livro da Márcia é como nos conectarmos com a fraternidade e com uma questão instigante: afinal o que fizemos com a civilização? Pessoalmente, sinto-me homenageado e feliz por fazer a 'lapela' desse luxuoso manequim de justiça. Marcus Menezes Barberino Mendes