"O ato do crime perverso, a operação do prestidigitador monstruoso, deixa um relicário mórbido: os restos. O autor repugna livrar-se deles. Ás vezes fica trancado por vários dias na companhia desses restos, dorme deitado ao lado do cadáver, ou num quarto sujo de sangue, cheio de vestígios. Essa intimidade com os restos macabros suscita uma impressão de estranheza, angustiante, que participa do filme de terror. Basta imaginar Barba Azul descendo em seu subterrâneo, contemplando em silêncio, na escuridão, seu tesouro de mulheres degoladas e presas à parede. Ou Gilles de Rais, diante de sua coleção de cabeças de meninos, alinhadas sobre baús. A coleção de Landru, contanto que seja bem filmada, seria igualmente angustiante. Na mansão de Gambais, um corredor, uma porta de madeira grossa, cuja maçaneta resiste, está fechada à chave. O que esconde? O buraco da fechadura incita por a ele espiar...- Durante dez anos, num serviço hospitalar especializado para doentes perigosos, ocupei junto a meus pacientes criminosos um lugar bem singular: o de psicanalista. Essa aventura me levou a considerar de maneira inovadora a figura contemporânea do criminoso perverso. O autor do crime perverso, autor de um crime, é também autor, ator e diretor de um espetáculo. Descobrir que o público colocado à prova de uma manipulação específica, é, sem querer e a contragosto, o parceiro do autor do crime perverso... Entender a mecânica da fascinação, as engrenagens precisas da manipulação... Desvelar o que escondem o excesso, a determinação cruel, a provocação... Encontrar a rigorosa e secreta lógica de um ato criminoso que se confunde com a imposição implacável de um destino... Elucidar as causas da passagem ao ato e de sua repetição, o enigma do serial killer... É essa a proposta deste livro.