"Ódio sustenido" reúne contos que têm na lucidez o principal fundamento. Contudo, Nelson de Oliveira abadona seu efeito mais tradicional: a configuração de um olhar realista sobre os fatos. A lucidez forma-se pelo humor, resultado de uma consciência especial, mais aguda e penetrante. Nelson cria dessa maneira uma tensão permanente entre a gravidade dos conflitos destacados e a maneira divertida de abordá-los. A comicidade ainda distancia os leitores dos tons alarmantes da sociedade contemporânea, mas o sentido crítico mantém-se presente, com unhas grandes e afiadas. Seu humor chega bem acompanhado. De um lado está o nonsense das situações bizarras, quase fantásticas, todas provenientes de cenas do cotidiano. Uma lente habilidosa amplia o estranhamento imerso em cenas banais e lança novas perspectivas, sempre inquietantes, para observar a realidade mais próxima. De outro lado estão as marcas de um lirismo que incide sobre a prosa. Nesse sentido, destacam-se sobretudo o ritmo dos contos, que parecem medidos com altímetro, e recursos como aliterações e assonâncias, que colaboram para ativar tanto o absurdo quanto o riso. A leitura flui, não há arestas, esquinas, tropeços para chegarmos à inquietude. Ela vem a galope e arrebata, intensificando os valores experimentais de sua linguagem, em si mesma atordoante. "Ódio sustenido" reúne 13 contos valiosos para um país que fez da indiferença um método.