A morte pede passagem. Poucos intelectuais lograram penetrar no mágico universo do carnaval; por isto, a literatura sobre a nossa maior festa popular é escassa e pobre. Na batida do surdo, felizmente, vem preencher essa imensa lacuna. O escritor Antonio Luiz Mendes de Almeida não freqüenta habitualmente as escolas de samba nem pertence a seus quadros administrativos ou artísticos, mas é um intuitivo, como ele próprio diz, e vai aos botequins conversar com gente do povo, retratando com extrema propriedade o espírito carioca, seu linguajar e maneirismos. Assim, pôde sentir o que Maffesoli chama de "respiração social" e conceber uma história muito bem encadeada, com fatos verossímeis que acontecem no cotidiano de uma escola que vai desfilar pela primeira vez no Grupo Especial do carnaval carioca. As personagens, sambistas que vão participar do evento, envolvem-se numa trama de interesses políticos, financeiros e sociais cujo entrecho prende o leitor da primeira à última página. Há um painel de acontecimentos que vão da aventura de tentar ganhar o samba-enredo às intrigas das armações para proteger este ou aquele elemento. A figura excêntrica do patrono da escola se projeta como a de um verdadeiro monarca tupiniquim, com seus poderes ilimitados e absolutos. Antonio Luiz consegue, com maestria, passar o clima barroco e surrealista presente em todas as etapas dos preparativos até chegar ao grande dia do desfile - e o leitor se imaginará no asfalto, na passarela, recebendo os aplausos e vivendo as emoções únicas do carnaval, o maior espetáculo da terra.