Como existir aos olhos daqueles que não nos olham? A partir de sua experiência singular no cuidado de crianças autistas, o poeta e pedagogo francês Fernand Deligny tateia outros modos de vida: abertos a circunstâncias, repletos de entrecruzamentos, trocas e encontros - um viver em rede, como numa espécie de teia de aranha. Não à toa, Deligny deixou sua marca na obra de Gilles Deleuze e Félix Guattari, sobretudo no conceito de rizoma. Ao longo dos quinze ensaios desta coletânea - organizada por Sandra Alvarez de Toledo e com posfácio do psicanalista Bertrand Ogilvie - é possível vislumbrar a radicalidade de seu pensamento, tanto através de sua escrita poética, aforística e aguda, quanto através de suas cartografias - um dispositivo astucioso para desbancar a primazia da linguagem. É nessa abordagem não invasiva, sem interpretação nem interpelação, numa distância deliberada em relação à psicanálise, que Deligny percorre o espaço-tempo silencioso no qual habitam crianças que não falam