Cuidado com aquelas que vêm de uma geração de mulheres silenciadas, pensei eu depois de entrar em contato com a poesia de Naiara Reis. Para cada três bocas que emudecem num século, vinga uma no seguinte que vocifera. Vociferar, falar com cólera, define o Dicionário Priberam. Clamar, bradar, exclamar. Nas palavras relacionadas, sugerem-se ainda estrondear, gritar, escarrar. Sangrar, digo então a mim mesma, em silêncio, na urgência de estender um pouco mais a lista. Essa urgência, descobri-a no seu mais fundo enquanto lia este Mulheres que sangram. Com uma dicção poética a um só tempo íntima e voraz, Naiara atravessa estas páginas como quem vem de longe. Do seu corpo se levantam outros, de tantas outras mulheres, cheias de desejos sufocados, fêmeas fartas espremidas dentro do meu peito. Na sua voz se ouvem ecos, um coro de vozes ancestrais. Mesmo a mudez ganha timbre aqui nesse caso numa espécie de performance do vazio, quando no poema Muda a autora nos convida a olhar não só (...)