A história já é mais do que conhecida: Dom Quixote, um nobre embriagado pela beleza dos contos de cavalaria, começa a se comportar de acordo com a própria fantasia. Sancho Pança, fiel escudeiro, aponta as incongruências entre a visão do mestre e a realidade vivenciada. Sarcasticamente, as duas figuras representam o encontro entre os campos de estudo do direito internacional e das relações internacionais. A analogia baseada nas duas figuras de Cervantes parece cômica e certeira, até o leitor avançar pelos primeiros capítulos de Dom Quixote reencontra Sancho Pança: Guerra Fria, Relações Internacionais e Direito Internacional. Nesta obra, Igor Abdalla Medina de Souza nos conduz por uma extensa historiografia das relações internacionais, vista pela ótica da associação desta com o direito internacional. Os juristas, cativados pela lógica e moralidade presentes em tratados e outros consensos internacionais, acreditam que o direito deva e possa sustentar a política internacional. Já os estudiosos da política entre estados dizem olhar para a realidade como ela é - não para como gostariam que ela fosse -, adotando a postura quase cínica parafraseada de Tucídides, pela qual os fortes exercem o poder e os fracos se submetem. Mas por ser o direito uma das mais consagradas fontes da prática heroica do Estado, reconhecer a subjetividade e arbitrariedade das instituições internacionais, dos padrões de comportamento por elas definidos e da produção de conhecimento a seu respeito é impreterível para imaginarmos e desenvolvermos ações inovadoras e efetivas de política externa que possam oferecer soluções aos profundos dilemas do mundo em que vivemos.