Nos primeiros anos deste século, a nossa literatura alcançava na ficção e no teatro uma espécie de plenitude de temas, técnicas e formas até então conhecidas e possíveis nos quadros mentais da inteligência brasileira. As duas margens da linguagem literária – a erudita e a popular – havia atingido, nos seus gêneros e níveis, a melhor expressão que se podia exigir das concepções literárias da época. A vertente erudita e universal teve o seu ponto culminante com a narrativa de Machado de Assis; e a popular, mais ostensivamente nacional, encontrou na vasta obra teatral de Arthur Azevedo a condição de se abrir para um público maior, divertindo-o ao mesmo tempo que lhe passava o conteúdo de uma crítica social que marcou profundamente a maioria de suas peças. Com Machado de Assis e Arthur Azevedo, mortos em 1908, morre também um certo modo de ser da nossa tradição literária. Depois deles, só mesmo o silencio... Ou, então, o nascimento de uma nova dicção com Lima Barreto que, estreando um ano depois, conseguiu fundir os dois níveis de linguagem e abrir possibilidades para a narrativa e para o teatro dos modernistas. Todo este preâmbulo para ressaltar a importância do trabalho de Antonio Martins de Araújo, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ele já preparou, prefaciou e anotou quatro tomos do Teatro de Arthur Azevedo e ainda tem mais dois aguardando publicação. E nos dá agora, com este Arthur Azevedo: A Palavra e o Riso, mais uma excelente contribuição, não apenas como filólogo, mas sobretudo como crítico e estudioso do nosso teatro. Partindo das formas mínimas dos provérbios, comuns no teatro variado de Arthur Azevedo, Antonio Martins analisa meticulosamente a mudança das formas de comicidade, de sátira, de ironia, de grotesco e de humor, propondo uma ordenação funcional do trocadilho na língua portuguesa e contribuindo assim para resgatar o sentido mais autenticamente popular da literatura brasileira.