Clément Rosset, considerado um dos mais importantes pensadores franceses vivos, tem em O real e seu duplo (Editora José Olympio) o principal marco de sua carreira de intérprete-filósofo do pensamento trágico (é tido como herdeiro de Schopenhauer e Nietzsche), tratando de forma sucinta e original a questão da duplicidade - que continuaria a ser estudada em suas obras posteriores. "O presente é, a cada instante, a soma de todos os presentes", afirma. O real e seu duplo é o 20º lançamento da coleção Sabor Literário, que vem disponibilizando aos leitores brasileiros textos inéditos ou pouco conhecidos de grandes escritores. "Nada mais frágil do que a faculdade humana de admitir a realidade, de aceitar sem reservas a imperiosa prerrogativa do real. Esta faculdade falha tão freqüentemente que parece razoável imaginar que ela não implica o reconhecimento de um direito imprescritível - o do real a ser percebido -, mas representa antes uma espécie de tolerância, condicional e provisória", escreve o autor. "Tolerância que cada um pode suspender à sua vontade, assim que as circunstâncias o exijam: um pouco como as aduanas que podem decidir de um dia para outro que a garrafa de álcool ou os dez maços de cigarros -"tolerados" até então - não passarão mais. (...) O real só é admitido sob certas condições e apenas até certo ponto: se ele abusa e mostra-se desagradável, a tolerância é suspensa. Uma interrupção de percepção coloca então a consciência a salvo de qualquer espetáculo indesejável. Quanto ao real, se ele insiste e teima em ser percebido, sempre poderá se mostrar em outro lugar." A tradução e a apresentação do volume são assinadas pelo doutor em filosofia José Thomaz Brum: "Este ensaio, que reúne gravidade, concisão e humor, aborda o célebre tema do duplo (Rank, Chamisso, Dostoiévski...) trazendo-o para sua origem: a recusa do real. É aí que se apresenta, pela primeira vez, a idéia do real como idiota, segundo a etimologia do grego idiotès, único e singular."