David Pinner é homem arredio, que tem consciência de sua insignificância. Uma vez um vibrante estudante de Artes, David atualmente é um professor universitário que destila cinismo no blog The Damp Review. Escrevendo sob a proteção de um pseudônimo, ele fala sobre o que lhe vem à telha, particularmente sobre artes plásticas, área na qual revela suas frustrações, refletidas em duras críticas virtuais. Frequentador contumaz de vernissages, David vai à abertura da exposição de obras de Ruth Marks, uma feminista americana que foi sua professora há muitos anos. O interesse despertado pelo reencontro deixa David desnorteado e, claro, interessado em aprofundar a amizade recém-criada. Mas a frustração ronda novamente a vida do professor quando Ruth mostra interesse não por ele, mas pelo colega de quarto de David: o belo, jovem e casto James Glover. É ele quem dá título ao thriller psicológico O erro de Glover, do premiado escritor irlandês Nick Laird. Autor de dois prestigiados livros de poesia e de um romance, Nick Laird é hoje um dos destaques da vibrante cena literária irlandesa. Casado com a também escritora Zadie Smith, Laird aborda, em seu quarto título e primeiro a ser publicado no Brasil, questões que lhe são caras - a amizade masculina, a lealdade e o amor constantemente postos à prova. E, dessa vez, Laird leva o assunto para um nível mais profundo de introspecção, potencializando a discussão sobre os sentidos do amor num mundo ditado por vaidade, cinismo e individualismo. Blogs, mensagens de texto, celulares e e-mails também ganham destaque na trama, já que as ferramentas determinam ou interferem no ritmo e no rumo do relacionamento dos protagonistas. No livro, o jovem colega de apartamento de David cometeu um dos maiores erros de sua vida: corresponder ao interesse de Ruth por ele. Ambos se conhecem por intermédio do professor universitário, que convida a artista para visitá-lo. David, que pela primeira vez se vê como ator principal de seu próprio show, passa, em segundos, a coadjuvante do romance de James e Ruth. David percebe, então, que, por mais que tente, volta sempre a ocupar seu lugar preferencial: o da insignificância. David estabeleceu uma convivência visceral com Glover durante a estada deste em seu apartamento. Ele não percebe, mas talvez ame Glover e a relação entre eles: a cumplicidade leve e masculina, sem exigências, as conexões com um terminando a frase do outro, a intimidade da dupla em todos os sentidos. E, com Ruth, David se vê num lugar iluminado e glorioso, ao lado de uma mulher culta, talentosa e inteligente. David pode ser igual a todos aqueles em que sempre descarrega seus ressentimentos no blog que escreve. É a chance de David: o melhor de dois mundos: Glover em casa e Ruth na cama. Ambos encantados com seus predicados. No entanto, a ciranda dos sentimentos é incontrolável: de uma só tacada, ele perde o afeto de Ruth e James. E se dá conta de que não há predicado nele: o que todos veem é uma pessoa cínica, apagada, desinteressante mesmo. Mas David aprendeu a se proteger: o que veem nele como defeito, ele toma como habilidades. E vai usá-los para minar a relação dos pombinhos. Seu cinismo e o fato de todos, em algum momento, o acharem digno de pena, irão permitir que ele manipule situações e mine a relação dos dois, encontrando em cada um deles sua própria carga de insegurança e ressentimento - como a neurose de Ruth com a idade avançada, com sua obra e com sua sexualidade dúbia, e o fervor religioso de Glover, aos 23 anos, um jovem que ainda vê o mundo de forma maniqueísta, preto no branco. David vê o mundo em tons de cinza e, por isso mesmo, não se considera o único vilão da história: Glover, mesmo sabendo do interesse de David por Ruth antes mesmo de se relacionar com ela, foi desleal com o amigo e, sempre que podia, o humilhava mostrando sua superioridade como conquistador, tratando-o como um coitado. Ruth sempre percebeu a tensão entre ela e David, David e Glover e atiçava a rivalidade entre os dois, com frases cheias de acidez. Mantinha David por perto, como um animal de estimação que achava poder manipular. A dupla, no entanto, subestimou o professor, como todos costumavam fazer. E esse foi seu grande erro.