Tendo por referência uma Fenomenologia da vida, Michel Henry investiga a gênese historial e filosófica da psicanálise a partir de seu conceito mais importante: o inconsciente. Neste sentido, torna-se bem significativa a tese presente no subtítulo o começo perdido de que esta concepção basilar encontra-se, sobretudo, vinculada a toda uma tradição filosófica pautada por um desconhecimento da natureza humana e de seus poderes, o que legitima a incapacidade de seu fundador em pensar a essência da vida tal como ela é em si mesma. Por não se ater ao que constitui a autenticidade da vida, realidades como afetividade, corpo e práxis, que lhe são inerentes, são lançadas em um submundo determinado pela cisão consciente/inconsciente. Freud é o herdeiro tardio e exemplar de uma herança que interpretará a subjetividade cartesiana eu penso, logo eu sou como um eu me represento, logo eu sou. Para Henry, porquanto se manifesta em um modo anterior à diferenciação entre manifestação e ocultamento, a subjetividade se determina, fundamentalmente, como um eu me sinto, logo eu sou, como pura autoafecção, o que faz com que se esquive à ek-stasis da representação, ou seja, à concepção do Ser como pura exterioridade. Deste modo, ao contrário de um eu exterior a si mesmo, o filósofo o entende sem a imediação de uma estrutura representacionista, pois, sentindo a si mesmo, revela-se antes como vida afetiva. Por fim, traçando uma herança que remonta a Descartes, Kant, Schopenhauer, Nietzsche e Heidegger, longe de ser a demonstração de um quadro histórico, Henry procura acentuar a problemática ontológica que está em jogo na elaboração do inconsciente freudiano, a fim de nos mostrar que, ao contrário de ser uma representação vazia, compreende-se melhor o inconsciente justamente como a própria vida, portanto, tendo por fundo, enquanto pathos, o advir em si da própria afetividade.