Maria Rilke afirma que, ao exercício poético, não há cotidiano pobre, pois o poeta é aquele que evoca suas riquezas e é se originando daí que um poema tem valor. Foi dito que Newton criou a Teoria da Gravidade durante a quarentena da peste bubônica, Shakespeare escreveu um de seus clássicos também durante uma quarentena, e monges, ainda hoje, se iluminam depois de anos de clausura. Digo isso sem romantizar a experiência política que nos obriga a forjar a solidão, a separação física do dia a dia social. Mas, à nível individual, quem poderia, a não ser o poeta, povoar essa solidão? É o poeta que se debruça na ausência, preenchendo o seu vazio. É o poeta que se debruça sobre o silêncio cantando com ele a mesma nota opaca até que um verso se faça. É o poeta que acha a fagulha de luz no seu próprio escuro e se ilumina de si. É rico o reino da poesia. Mesmo que o cotidiano o esconda, o poeta o redescobre como a criança o redescobre. Este livro é um exercício de manter fértil o (...)