História e contra-história - Perfis e contrapontos, do historiador Carlos Guilherme Mota, é o segundo volume das suas obras reunidas (previstas para quatro volumes). O livro reúne e pereniza textos de difícil acesso, publicados entre 1973 e 2007, nos mais variados meios e formatos, de artigos e entrevistas para jornais e revistas a capítulos de livros, conferências e pequenos ensaios. Os textos foram selecionados pelo autor, por Ronald Polito e por Candido Malta Campos, e prefaciados pelo último. Apesar dessa multiplicidade de formas e formatos, as constâncias prevalecem, e permitem a divisão do livro em duas partes, referidas no subtítulo. A primeira, intitulada "Contrapontos: interpretações do Brasil" - que bem poderia se chamar reinterpretações do Brasil -, traz textos que debatem ou rebatem ideias e conceitos consagrados da historiografia brasileira. A começar por "Os fazendeiros do ar", corajoso "artigo-resposta ao longo, duro e discretamente irado artigo que Sergio Buarque de Holanda [...] escreveu em 1973, aplastando o então jovem aprendiz de historiador". A ira de Sérgio Buarque se explica, segundo o próprio Mota, por este haver colocado, "sem querer (querendo), em discussão a ideologia da cultura brasileira", com a publicação, em 1972, de 1822: dimensões. Não é de surpreender que a obra de Mota, nosso mais consagrado cultor da história das mentalidades, tenha buscado aplicar a visão de Raymundo Faoro, sobre o patrimonialismo das elites políticas brasileiras, ao campo intelectual em geral, e ao historiográfico em particular. Entre os títulos dessa primeira parte estão: "Oliveira Lima e nossa formação", "Em exame a obra de Caio Prado Júnior", "Ecos da historiografia francesa no Brasil: apontamentos e desapontamentos", "Raymundo Faoro e a revelação de um outro Brasil", "Intérpretes do Brasil: Antonio Candido e Raymundo Faoro", "A universidade brasileira e o pensamento de Gilberto Freyre", "Civilizando a barbárie: Golbery e Geisel", "Os dois Darcys", "Presença de Florestan no iea". A segunda parte do livro, "Encontros: conversações e perfis", constitui-se de uma pequena coletânea de breves notas sobre alguns intelectuais que o autor considera exemplares, e que são, além disso, exemplos de sua independência intelectual, pois nem todos estão entre os mais conhecidos ou consagrados, além de serem de várias nacionalidades. São eles: Antonio Candido, Charles Boxer, Fernand Braudel, Florestan Fernandes, Francisco Iglesias, Joaquim Barradas de Carvalho, José Honório Rodrigues, J. R. do Amaral Lapa, Lucien Febvre, Richard Morse e Sérgio Milliet. Como sintetiza o prefácio, o livro permite constatar a "atualidade da postura crítica protagonizada por Carlos Guilherme Mota e levada a cabo com tanta consistência em seus textos, tenham eles o tom caracteristicamente polêmico presente na primeira parte desta coleção, ou o caráter mais ‘conversável’ dos perfis e diálogos da segunda parte". Resta acrescentar que há muitas passagens pessoais espalhadas pelos textos, e que elas podem ser muito saborosas. História, sim, mas com face humana.