Da arguta percepção do que há de aparatoso exibicionismo - e, consequentemente, de potencial voyeurismo - na poética de Florbela nasce este livro que me coube prefaciar. Nele a autora lança luz sobre alguns dos sedutores autorretratos que o sujeito lírico-feminino da poesia de Florbela Espanca - em Livro de Mágoas, Livro de Sóror Saudade e Charneca em Flor - apresenta ao seu leitor, debruçando-se especialmente sobre aqueles que, segundo a autora, foram os mais caprichosamente delineados pela poetisa portuguesa: o da camponesa, o da castelã ou princesa, o da monja ou sóror, o da charneca e o da poetisa. Perscrutando-os no conjunto de sonetos que perfazem os três livros de Florbela acima mencionados, Jussara Neves Rezende analisa meticulosamente mais de uma vintena de poemas, iluminando, como convém, as formas da poesia florbeliana - ritmo, sonoridade, rimas, contrastes, paralelismos, relações estruturais, enfim - e o seu potencial alcance expressivo. Deste exercício de crítica literária resulta, afinal, admiravelmente saliente a coerência entre os significados da poesia de Florbela e os seus significantes - as suas formas envolventes -, tudo apontando, em uníssono, para um corpo que se quer visto, atentamente olhado.