Este livro faz uma análise crítica do conceito normativo de culpabilidade à luz das contribuições trazidas pelas teorias criminológicas da reação social e crítica, propondo uma nova concepção de culpabilidade que considere em sua estrutura não apenas os elementos formais da culpabilidade de ato, mas também um elemento valorativo consistente no grau de vulnerabilidade do agente frente ao poder punitivo. De fato, uma vez evidenciado pela teoria do labeling approach e pela criminologia crítica que o delito não é um fenômeno natural e apriorístico, mas sim uma realidade construída socialmente de acordo com os interesses da classe dominante, e que o poder punitivo se constitui em instrumento dessa dominação, sendo exercido de forma seletiva, arbitrária e violenta majoritariamente sobre aqueles indivíduos marginalizados, toda a teoria do delito e, mais especificamente, o conceito de culpabilidade entraram em uma grave crise de legitimidade, mostrando-se necessário reformular essa categoria do delito de forma a dotá-la de conteúdo minimamente racional. Assim, desenvolveu-se inicialmente a tese da coculpabilidade, segundo a qual a sociedade, ao deixar de oferecer a todos os indivíduos as mesmas condições e oportunidades para alcançar os objetivos culturalmente impostos de forma legítima, seria corresponsável pela prática do ato ilícito, o que reduziria o juízo de reprovação realizado sobre o agente. No entanto, tendo em vista os problemas apresentados por essa teoria, que desconsiderava a seletividade do poder punitivo, propôs-se a elaboração de um novo conceito de culpabilidade penal que constitui a síntese entre a culpabilidade de ato reduzida pela culpabilidade pela vulnerabilidade, e que poderá ensejar a atenuação da pena ou até mesmo a exclusão da reprovabilidade do agente, permitindo ao julgador minimizar as desigualdades e injustiças produzidas pelo sistema penal mediante a distribuição equitativa do seu poder de contenção.