Sonhar mais um sonho impossível... Lutar quando é fácil ceder... Negar quando á regra é vender... Voar num limite improvável...Todos os que participaram dos tempos duros e sombrios da Ditadura Militar têm a natural, e compreensível, tendência ao eterno retorno ao tema, como uma forma de purgar sentimentos recalcados e mais sublimados. A sensação que nos invade ao término da leitura deste importante depoimento de Markian Kalinoski, trágico e cômico ao mesmo tempo, é a de ter ouvido uma confissão, um descarrego, um trabalho de luto destinado a enterrar, sob pás de cal, um passado terrível e patético. Deixando, porém, sobreviver tudo o que nele era humano, demasiadamente humano. Querer salvar é sublime; julgar-se um salvador, é ridículo, dizia Cervantes. Markian, que teve o ímpeto sublime, não ostenta ridículas pretensões. Sua narrativa tem o mérito de, com o distanciamento proporcionado pelo tempo, humanizar, relativizando, as posturas assumidas por aqueles jovens idealistas, repletos de ilusões pueris. A santidade da causa nos entorpecia, fazendo-nos olvidar que as revoluções nunca corrigiram injustiças sem criar outras.De seu depoimento emerge, claramente, a constatação de que a qualidade das almas supria a qualidade das idéias. Visões de mundo totalizantes, verdades universais impostas como dogmas, transfiguravam nossas paixões em armadilhas. Ao termino desta agradável leitura, avulta a presença de um Markian maduro, pensador crítico, consciente dos equívocos da realidade e, igualmente, cônscio da falácia dos milenarismos redentores, questionando, perpetuamente, suas hipóteses e seus julgamentos.Remanesce, porém, a advertência imorredoura do Quixote, que via na história a êmula do tempo, depositária de ações, testemunha do passado, exemplo para o presente e advertência para o futuro.