Após ler esse livro, imaginei Nelson Rodrigues se aproximando e falando de maneira espetaculosamente confidencial: Todo cínico é um imoral. Nelson nunca disse isso, mas posso imaginá-lo sentenciando e lacrando o caixão da via crucis fanfarrona de Cacambo, esse legítimo e inquestionável filho da puta cujas histórias de amor começam ao som de Pat Metheny e percorrem essas páginas na velocidade de um fusca 1974 com as janelas abertas e com o Cândido de Voltaire como co-piloto. Me parece sintomático que o personagem tente de todas as maneiras engravidar alguém enquanto ouve Tim Maia. Paulo Ribeiro constrói aqui a saga de um anti-herói anti-macunaímico, já que não é pelo viés da esperteza e da malandragem que o personagem irá se safar e sim pela quase inocência e pela tentativa malogra de permanecer cínico. Com uma narrativa ousada e veloz, temos aqui a história de um personagem errôneo que não faz a menor ideia da curva em que capotou o seu fusca. E mesmo assim irá continuar acelerando. E Nelson Rodrigues piscará para mim do fundo da sala. Eu te disse, não disse? Mário Bortolotto