nunca pensei que esse dia chegaria: o de assumir a perseverança de desnudar-me. olhar para o universo, à noite, e rasgar minhas vestes, sem saber para onde ir. catar os trapos, esmolambados, e recompor, com o sol que se levanta no horizonte, minhas vicissitudes e regozijos. instantes que aparecem, como versos, no livro. desprezei, por alguns anos, tais versos. nem sei se os tenho em conta, hoje. disseram-me, uns e outros, que falavam da agitação que era minha pobre alma, apaixonada e desditosa, que caminha(va), no plano terreno, em busca do amor. não sabendo se, um dia, voltarei a encontrá-lo, penso que, publicados, esses fragmentos possam soar como um registro das jornadas empreendidas, na terra, com uma finalidade: a busca de encontrar-me no outro, ou, na melhor das hipóteses, de constatar que sou finito. isto é, perceber que, por um mistério, aquilo de que não dispomos, buscamos em outrem. nu é, também, uma tentativa desventurada de entender-me. de procurar, olhando de soslaio para meu interior, as razões pelas quais vivo – ou, pelas quais, teimo em amar. e, ainda, de compreender os sentidos dos toques, dos cheiros, das oitivas, das visões e das provas, que expresso nos desejos mais íntimos, decantados nas palavras mais tolas. despido, embriagado, dou-me nas palavras torpes e insidiosas que compõem as páginas do livro. desfolhado, em êxtase, entrego-me aos olhos de quem lê os versos silenciosos aqui encarnados. nu, necessitado, ofereço-me, como os verbos quentes que ardem em ânsia, nas páginas que se seguem.