Esta Centelha que o leitor tem em mãos abarca dois tempos, situados nos dois extremos do sonho do desterro. O primeiro ciclo de poemas, de ‘Acaba com minha voz’ a ‘Bloco de notas’, escrito entre 2002 e 2008 aproximadamente, prenuncia a partida da autora para o Brasil, onde viveria por cerca de sete anos e se dedicaria à realização de uma obra cinematográfica documental de profunda delicadeza e engajamento. Somam-se a esses os poemas escritos após seu regresso a Portugal, em 2017, por ocasião de uma residência literária no Teatro do Silêncio, em Carnide. Entre esses dois tempos reunidos, a fricção de que nasce a Centelha, título de um de seus poemas mais recentes. Acaba com minha voz, começa com meu corpo inteiro. Esse impactante verso de abertura desata uma das forças motrizes do livro, um ímpeto para a dissolução que se revela ora nessa súplica a um outro, ora na negociação com certa violência simbólica, ora no explícito desejo de fuga da paisagem familiar, num movimento de aura(...)