Este trabalho tem o objetivo de delimitar categorias jurídicas relevantes e promover um aprofundamento inicial sobre os julgamentos de cortes constitucionais que envolvem o tema do endividamento público argentino após a crise do início dos anos 2000, mediante a análise dos diversos discursos críticos das referidas decisões. Nos casos que constituem o objeto da pesquisa, verifica-se uma contínua tensão entre os poderes da soberania e os poderes dos contratos, o que leva a uma discussão sobre o posicionamento dos Estados como entidades negociantes na arena das finanças. Tal tensão pode ser localizada historicamente no contexto de mudanças sociais, políticas e econômicas que deslocaram os discursos sobre o exercício de poder de uma dimensão imperial centrada na razão de Estado para uma outra centralizada em uma governamentalidade centrada em figuras de gestão. O direito constitucional, especialmente por intermédio da figura do rule of law, surge, nesse contexto, como elemento legitimador das dominações dessa quadra histórica. Seu catalisador principal na segunda metade do século XX, as cortes constitucionais não escaparam dessa mobilização. O tratamento dado à questão do endividamento argentino torna-se um elemento indiciário da questão, de modo que decisões diversas daquelas que favorecem tal forma de governamentalidade somente são possíveis mediante o apelo a uma possível suspensão da ordem. Essa suspensão, entretanto, é facilmente afastada pela emergência constitucionalmente legitimada dos discursos de imperiais de expansão econômica, a sinalizar a conformação jurídica de uma relação de suserania e vassalagem entre credores tutelados por suas ordens jurídicas nacionais ocupantes da posição dominadora e países endividados transformados em vassalos da ordem econômica internacional.