“Tenho nada a dizer, ainda assim, digo.” Assim começa um dos minicontos de Fugas – Pausas e Desatinos. Este livro de pensatas em forma de narrativa tem muito adizer, ao nos transportar bruscamente a instantes da realidade íntima de personagens ao mesmo tempo únicos e universais. Sem pedir licença, adentramos o quarto, a sala, o trabalho, a mente de irreais pessoas reais. Engana-se o potencial leitor que ache que a brevidade dos textos fará com que a leitura seja rápida: na frenética mudança de cenas, por vezes há que se parar para refletir, indagar, imaginar, vivenciar, sorver, ser aquela personagem. “Ser é um ato de rebeldia de beleza inegável. Ser dá trabalho.” Segundo a escritora irlandesa-britânica Elizabeth Bowen, “toda ficção é obrigada a ser autobiografia transposta”, apesar do esforço do ficcionista de “derrotar o reconhecimento ordinário” (tradução livre).