"Se existe alguma documentação acerca da produção cultural erudita no Brasil, o mesmo não pode ser dito no que concerne à produção popular ou aquela produzida por sujeitos que se encontram, histórica e socialmente, à margem dos grupos hegemônicos. Se a abstrata e sempre tendenciosa qualidade artística das obras, cujo estofo e escopo fundamenta-se nos cânones clássicos, nada, a não ser os preconceitos raciais e classistas, justificariam a exclusão dos músicos e cantores negros da história da música erudita brasileira. Em tese, e a partir de significativa pesquisa documental, Antônio Carlos dos Santos toma como objeto de investigação a participação de escravos negros como músicos e cantores na Real Fazenda de Santa Cruz, localizada no Rio de Janeiro, de 1808 (chegada da Família Real Portuguesa ao País) até 1871. Nessa ampla fatia de tempo, o pesquisador apresenta tanto os motivos econômicos na formação de escravos e ex-escravos no aprendizado da música erudita. De todos os motivos, destaca o autor principalmente o fato de tanto os observadores estrangeiros como os brasileiros "bem nascidos" conceberem os negros de modo perversamente ideológico. Trata-se, portanto, de excelente possibilidade de ter acesso a um significativo trabalho desenvolvido por negros músicos escravos em um período da história repleto de tantas lacunas históricas."