'Antropofagia e Aorgia. Deglutição ritual e clareira meta-humana. Oswald de Andrade percebeu que a antropofagia é a mais arcaica forma de comunhão existente sobre a Terra. Como única lei do mundo, ela seria a expressão mascarada de todos os individualismos e de todos os coletivismos. Por seu lado, para Vicente Ferreira da Silva, o aórgico, aquilo que não foi feito pelo homem, tem suas raízes na origem meta-humana da cultura. Em nossa época, vivemos aquilo que Eliade definiu como segunda Queda - não percebemos mais o profano como profano. Assim, Aorgia pode vir a ser um novo paradigma metafísico global? A Antropofagia será um novo princípio religioso planetário? Na dinâmica secularizadora entre patriarcado e matriarcado, messianismo e antropofagia, crença e agonia, sagrado e profano, teurgia e aorgia, a hermenêutica mítica de Vicente e Oswald talvez seja um caminho para desativarmos o ciclo sacrifical e salvarmos o nosso bode expiatório de cada dia. Nisso consistem a utopia antropofágica de Oswald, a utopia aórgica de Vicente. Quando a assimilação recíproca dos infinitos povos, línguas e culturas finalmente configurar um Reino, este, certamente, não será de outro mundo. Mas tampouco será deste. Enfim não seremos mais iguais perante Deus. Mas sim idênticos perante o desejo.' - Rodrigo Petronio.