Acho que Ana Paula Pacheco conseguiu evitar dois equívocos neste seu livro de estreia na ficção: o primeiro, a ostentação, que também se veste com uma aparente simplicidade. Aqui a voz é baixa, às vezes quase indistinta, a começar pelo título do volume, enquanto o traço meticuloso não significa ausência de violência. É que em vez do tiro, ela prefere a arma branca.O segundo equívoco evitado é o da inocência das transposições diretas vida/ ideologia/ erotismo etc., e literatura, o que facilmente conduz à tagarelice, não necessariamente decorrente da extensão do texto, mas de sua fraqueza. É oportuno recordar Lukács (A alma e as formas) quando afirma que toda obra literária é construída em torno de uma pergunta apontando um caminho, que inesperadamente, mas com força inexorável, pode interromper-se num silêncio imprevisto. Uma pergunta, e a seu redor a vida desconcertada; um silêncio, e a seu redor o murmúrio, o rumor, a música, o canto a plenas vozes: esta é a forma. Por isso, diante desses vinte e dois textos, com títulos e extensões variáveis, se quisermos por hipótese descobrir a pergunta que conduzirá a seu entendimento, devemos levar a sério a imposição do último conto: “é preciso voltar sempre ao mesmo ponto”.Mas que ponto será este e que pergunta deverá ser feita?