Nos quarenta poemas de seu primeiro livro, o poeta paulistano Rafael Mantovani cerca seus cães-fantasma, desenhos de uma identidade espremida contra as coisas que a limitam, incapaz de participar das categorias éticas que conhece, submetida às guinadas dos afetos e humores. O que orienta este sujeito afetivo é antes de tudo um erotismo bruto e rente ao chão, em que o lírico se tece com o mesmo fio do satírico. Ao deparar-se com os obstáculos que impedem o acesso ao mundo humano, o eu-cachorro constata: "minha burrice me dói/ como uma pedra no rosto/ como uma pedra em vez do rosto".