Há séculos, as histórias de masmorras e cativeiro atravessam a literatura, e nos lançam, sem piedade, em um mundo de pavor e sombras. Diariamente, os relatos de prisões injustas, de torturas e abusos enchem as páginas de jornais, desafiando a nossa quase indiferença. O livro “Voo para a Escuridão”, de Marcelo Simões, nos alcança nessa encruzilhada de tragédias e estilos – e nos alerta como o abismo pode estar, ali, na próxima esquina ou no primeiro portão de embarque. Principalmente, se temos o preconceito, a ingenuidade e o acaso atuando em sintonia perversa e simultânea contra nós. A história de Jak Mohammed Harb poderia ter saído da cabeça de um romancista, com o risco de o personagem parecer artificial, de construção óbvia e fácil, por causa da teia de estereótipos e bolsões de preconceitos que o envolve: colombiano,comissário de bordo, homossexual, flagrado quando recebia dólares de um traficante em um hotel nas imediações do aeroporto de São Paulo e lançado, sem piedade, nos labirintos do Presídio de Guarulhos II e da Penitenciária de Itaí. Mas a história de Jak é real e recriada, com brilhantismo, por um competente jornalista. A prova de que uma pessoa inocente, porém ingênua, pode ser vítima de uma conspiração de aparências e pagar caro por isso.