O que vem da sua boca, romance da canadense Nancy Richler, é a longa carta de uma mãe para sua filha. Miriam escreve compulsivamente para não enlouquecer. Judia russa que cumpre prisão perpétua na Sibéria de 1911 por ter desafiado o czarismo, ela cresceu sem mãe e jamais conhecerá sua própria filha. Enquanto conta sua triste história, com toques de realismo mágico e sem jamais perder o humor, Miriam mostra como eram violentos aqueles anos pré-Revolução Russa. A maior derrota dessa presa política, no entanto, não foi o fracasso dos bolcheviques em 1905, ano de sua condenação, mas as tentativas sempre frustradas de revolucionar sua própria vida. Miriam jamais soube o que é amor de mãe, porque a sua se suicidou no dia de seu nascimento. Seu pai, Aaron Lev, preferiu entregar a filha aos cuidados de uma outra pessoa, Lipsa, a ama-seca. Somente aos 6 anos ela foi pega de volta, mas Aaron não passava de um estranho, incapaz de se afeiçoar a quem quer que fosse. A segunda esposa do jovem, Tsila, preferiria não ter que criar a filha dos outros, mas pelo menos ela dá a Miriam educação, uma identidade judaica e a necessidade de questionar o mundo. Já crescida, Miriam se vê envolvida com agitadores socialistas, meio que por acidente. O ideal revolucionário era um alento para os judeus russos, fartos do anti-semitismo. E, de repente, ela se descobre ao mesmo tempo grávida e condenada à forca. É no gélido corredor da morte siberiano que Miriam dá à luz uma menina, imediatamente entregue à adoção por parte de Bayla, a irmã de Tsila. É a única maneira de salvar a vida da criança, levada para o Canadá. Miriam jamais verá sua filha novamente. Ela não chega a ser enforcada, mas cumpre prisão perpétua. Doente e deprimida, a prisioneira é uma mulher de quem foram extirpadas as raízes sua mãe e o fruto sua filha. Para manter a sanidade, ela escreve sem parar para sua menina, contando toda sua trajetória desprovida de amor. Uma carta que, provavelmente, nunca chegará à destinatária. É uma história terrivelmente dura, mas contada com a delicadeza de uma mãe, ainda que ela não tenha como saber o que "ser mãe" significa.