Para além da grande política, o final do século XIX descobriu, principalmente pelas mãos de Walter Benjamin, a importância dos chamados pequenos fatos na recuperação histórica, não só pelo que podem encerrar de simbólico, como também pelo que podem recuperar de sabor de vida, de reminiscência. Sujar a auréola poética na lama das ruas, ou seja, na efervescência dos sem-história, eis uma postura literária radicalmente moderna, que não pára de ecoar até nossos dias, principalmente no ofício da crônica, que, por definição, deve associar história e estória. Que o comprovem estejam certos o jornal do dia ou o tão celebrado Novo Jornalismo americano. A sensibilidade de Machado de Assis inteligência precisa em terra de relógios desacertados foi uma das primeiras a captar no Brasil do século XIX essa tendência, para não dizer necessidade. Mais: sua crônica ajudou a fundar por aqui uma maneira particular de falar de história, ao mesmo tempo consistente e leve. Consistente porque reveladora de mecanismos políticos e sociais presentes na sociedade brasileira até hoje. Leve porque fiel ao estilo do autor, sutil, irônico, criador de vozes narrativas envolventes, capaz e alcançar os assuntos mais sérios através de uma aparência frívola esquivando-se, assim, da figura da história, gorda e pachorrenta.O tema deste livro, a série de crônicas intitulada Bons Dias!, publicada entre 1888 e 1889, é a perfeita síntese desse registro machadiano. Tanto que nela encontramos, por exemplo, uma sátira ao transporte do meteorito caído em Bedengó e, no mesmo texto, uma discussão sobre a implantação do federalismo no Brasil. Bons dias! é uma das matrizes da tradição de um gênero brasileiro por excelência: a crônica, nem maior, nem menor híbrida, e com orgulho.