Partindo de uma passagem obscura da biografia de Michelangelo, Mathias Énard constrói uma novela brilhante. Misto de romance histórico e ficção, o autor usa a prerrogativa do escritor. Ou do "fingidor", como dizia Fernando Pessoa referindo-se ao ofício de escrever poesia. Tudo são verdades? Onde é o limite entre os fatos e a farsa? Pois tudo começa quando o genial artista italiano se desentende com o sinistro papa Júlio II - que era especialista em cortar cabeças de seus desafetos - e aceita o convite do sultão Bayazid para projetar uma grande ponte sobre o Corno de Ouro, no estreito de Bósforo. O sultão havia recusado o projeto do já famoso Leonardo da Vinci. Baseado em fragmentos de verdade, Énard solta a imaginação apoiado na atmosfera mítica e mística da Istambul do século XVI. Reconstitui o ambiente de fausto e mistério, os personagens enigmáticos e a perplexidade do mestre italiano diante do mundo muçulmano, da arquitetura inebriante e sedutora com seus minaretes e abóbadas sensuais. E entre ficção e realidade o autor reconstitui o curto período da estada de Michelangelo Buonarroti em Istambul. O resultado é esta novela de leitura arrebatadora, que é contada com o mesmo fascínio das histórias nas quais se fala de batalhas, de reis e de elefantes.