Quem quer que se debruce sobre o pensamento jurídico contemporâneo, com suas múltiplas escolas e correntes, poderá concluir, sem medo de erro, que Kelsen é o pensador central da Filosofia do Direito de nossa época. A favor de Kelsen ou contra Kelsen, ele foi o marco divisório de uma quantidade significativa de juristas que tiverem de iniciar suas trajetórias posicionando-se com relação às ideias do mestre de Viena. Poucos autores tiverem a influência global de Kelsen, traduzido do Japão ao Brasil, em uma quantidade enorme de idiomas, atestando a possibilidade de um projeto de Teoria Geral do Direito. Que sua obra ocupe tal centralidade nem sempre lhe foi favorável. No centro de grandes polêmicas, Kelsen foi mais hostilizado ou reverenciado do que compreendido. A presente coletânea, que enfoca as diferentes dimensões do combate kelseniano contra os absolutismos filosóficos, jurídicos e políticos de sua época, demonstra a vitalidade de uma obra que não se esquivou diante dos grandes dramas humanos do terrível século XX. Revisitando tais dimensões, constatamos que, afinal, o mestre do relativismo nunca se furtou de nos oferecer, corajosamente, a sua verdade, mesmo sabendo do caráter relativo, contingente e provisório de todas as verdades. Há um movimento internacional de retomada do pensar kelseniano cujo marco é a progressiva publicação de suas obras completas na Alemanha, projeto atualmente em curso sob os auspícios do Instituto Hans Kelsen de Viena. A presente coletânea vem se somar a esses esforços, pretendendo contribuir para a discussão profunda e transdisciplinar da obra kelseniana. Para tanto, são apresentados pela primeira vez em língua portuguesa dois trabalhos de Kelsen de capital relevância para a construção do seu pensamento - Deus e Estado e A Alma e o Direito -, além de quinze artigos de especialistas da Áustria, Brasil, Espanha, Estados Unidos da América, Itália e México que procuram restituir à tradição kelseniana toda a dignidade política e filosófica que merece aquele que é considerado, com toda justiça, o mais importante jurista do século XX.